Associação Brasileira de Engenharia Sanitária e Ambiental

Regionalização para a prestação dos serviços de saneamento e os impactos na elaboração de planos municipais de saneamento básico — estudo de caso em Alagoas

Ana Letícia Gaia da Rocha Almeida¹, Letícia da Silva Santos², Marcos Vinícius da Silva Santos³, Laíne Aparecida Silva⁴, Fabiana de Cerqueira Martins⁵

Resumo

Considerando-se os incentivos proporcionados pelo Novo Marco Legal do Saneamento em relação à prestação regionalizada de serviços, o objetivo principal deste estudo foi avaliar se existe uma diferença significativa na elaboração de Planos Municipais de Saneamento Básico (PMSBs) ao comparar municípios que aderiram à regionalização com aqueles que não aderiram, no estado de Alagoas. A metodologia adotada neste trabalho envolveu a coleta de dados qualitativos para construir seis indicadores relacionados ao processo de elaboração dos PMSBs. Utilizou-se o método de estudo de caso, comumente empregado em várias áreas do conhecimento para investigar dados reais em pesquisas exploratórias. De maneira geral, verificou-se que a adesão dos prestadores de serviço e do Grupo de Trabalho como um todo aos eventos de mobilização social foi inferior nos municípios com regionalização. Esse cenário pode sugerir um desinteresse na elaboração do PMSB, possivelmente devido à existência de um Plano Regional de Água e Esgoto. Os resultados também apontam que, em termos de participação da sociedade civil, não houve discrepância; no entanto, nos municípios com regionalização, a população enfrentava dificuldades em identificar o real prestador de serviços. Diante dessas constatações, a experiência destaca a importância de definir e implementar mecanismos de controle social, visando à inclusão da sociedade no planejamento e na fiscalização dos serviços de saneamento. Além disso, destaca a necessidade de aprimorar as estratégias de comunicação dos prestadores regionalizados para garantir uma compreensão mais clara por parte da população.

Given the incentives of the New Sanitation Legal Framework, with regard to the regionalized provision of services, this study aimed to determine whether there is a significant difference in the preparation of Municipal Basic Sanitation Plans (Planos Municipais de Saneamento Básico – PMSB), when comparing municipalities that have either adhered or not to regionalization in the state of Alagoas. The methodology of this work was based on qualitative data found to construct six indicators inherent to the PMSB preparation process. The case study methodological procedure was followed, frequently used in different areas of knowledge for the study of real data in exploratory research. It was found that, in general, the adherence of service discussions and the Working Group to social mobilization events was lower in municipalities with regionalization. This fact may indicate a lack of interest in preparing PMSB, due to the existence of a Regional Water and Sewage Plan. Results also indicate that, in terms of civil society, there was no discrepancy; on the other hand, in municipalities with regionalization, the population did not understand who the real service provider was. In view of this, experience has shown that it is essential to define and implement social control mechanisms (as a way of including society in the planning and inspection of sanitation services) as well as to improve the communication strategies of the regional communities discussed.

1. INTRODUÇÃO

Sob a justificativa de garantir o direito humano ao saneamento, o governo federal promulgou a Lei n° 14.026/2020, que atualiza o Marco Legal do Saneamento (BRASIL, 2020b). Dentre as mudanças introduzidas na Lei n° 11.445/2007 (BRASIL, 2007), destaca-se o incentivo a investimentos privados no setor e a uniformidade da regulação dos serviços, incumbida à Agência Nacional de Águas e Saneamento Básico (ANA).

No que concerne à elaboração de Planos Municipais de Saneamento Básico (PMSB), o principal impacto é, provavelmente, o princípio fundamental da regionalização. Este conceito refere-se ao agrupamento de municípios, com a gestão associada dos serviços, assegurando eficiência e sustentabilidade econômica da prestação. Conforme o inciso XIV do Art. 2° da Lei Federal n° 11.445/2007, inserido pela Lei Federal nº 14.026/2020, a regionalização visa “à geração de ganhos de escala e à garantia da universalização e da viabilidade técnica e econômico-financeira dos serviços” (BRASIL, 2007, 2020b).

A Figura 1 apresenta um fluxograma para o estabelecimento da regionalização dos serviços de saneamento básico. A criação das estruturas regionalizadas deve ser precedida de estudos técnicos e audiências públicas, envolvendo todos os municípios da unidade a ser criada. O prazo para a instituição da regionalização, estabelecido pelo Decreto Federal nº 11.030/2022, encerrou-se em 31 de março de 2023.

Além disso, para considerar o processo de regionalização de um estado concluído, é necessário constituir as novas estruturas de governança interfederativas, seguindo a estrutura presente na Lei 13.089/2015, o Estatuto da Metrópole. A governança deve basear-se em um conselho deliberativo com todos os entes federados integrantes (municípios e estado), com a participação de representantes da sociedade civil.

De acordo com a Lei nº 14.026/2020, a prestação regionalizada pode ser estruturada em:

  • Região metropolitana, aglomeração urbana ou microrregião: estrutura instituída pelos Estados mediante lei complementar, composta por municípios necessariamente limítrofes e regida pelos termos estabelecidos no Estatuto da Metrópole (Lei nº 13.089/2015);
  • Unidade regional: estrutura instituída pelos Estados mediante lei ordinária, composta por municípios não necessariamente limítrofes;
  • Bloco de referência: estrutura instituída pela União e criada por meio de gestão associada voluntária dos titulares, composta por municípios não necessariamente limítrofes.

Segundo avaliação do Instituto de Água e Saneamento, até agosto de 2022, 17 dos 26 estados possuem lei que estabelece a prestação regionalizada aprovada, e apenas 8 estados avançaram na definição de instâncias de governança regionais. Com as 17 leis aprovadas, até agosto de 2022, foram instituí- dos 77 arranjos regionais, sendo 10 Unidades Regionais e 67 Microrregiões ou Regiões Metropolitanas. “Cada uma destas regiões, assim como as futuras a serem criadas pelos nove esta- dos que não têm suas leis aprovadas, deverão instituir suas governanças regionais e aprovar planos regionais de saneamento” (INSTITUTO DE ÁGUA E SANEAMENTO, 2022).

No mais, a adesão dos Municípios às estruturas de prestação regionalizada pode ocorrer de forma compulsória, especialmente no caso de regiões metropolitanas, aglomerações urbanas ou microrregiões. Em contrapartida, para as unidades regionais e os blocos de referência, a adesão pode ser voluntária. No entanto, mesmo quando uma região metropolitana, aglomeração urbana ou microrregião decide voluntariamente aderir a uma unidade regional ou a um bloco de referência, a adesão dos municípios permanece compulsória. Isso ocorre porque eles estão sujeitos à decisão regional (BRASIL, 2020b).

Apesar da existência de adesão voluntária, o Novo Marco Legal prevê estratégias e incentivos para que os municípios optem pela gestão associada dos serviços. Isso ocorre por- que, conforme o Art. 2º §1º do Decreto nº 10.588 de 2020, para acessar recursos públicos federais e financiamentos com recursos da União, será exigida a comprovação da prestação regionalizada. Além disso, as normas de referência para a regulação dos serviços de saneamento básico devem incentivar a regionalização da prestação, contribuindo para alcançar os objetivos desse modelo (BRASIL, 2020a).

Considerando o cenário brasileiro atual, o Quadro 1 apresenta um compilado dos tipos de regionalização para a prestação dos serviços públicos de água e esgoto no Brasil. Em relação ao estado de Alagoas, a Lei Estadual nº 8.358/2020 instituiu três unidades regionais, sendo uma delas a região metropolitana de Maceió. As outras duas unidades contemplam 89 dos 102 municípios integrantes do Estado. Além disso, estabeleceu-se a estrutura de governança por meio de decreto estadual, e o Estado avança na elaboração de estudos e planos regionais. De acordo com o Instituto de Água e Saneamento (2022), os estudos para a concessão da Companhia de Saneamento de Alagoas (CASAL) são equivalentes ao plano regional de saneamento, algo permitido pelo Novo Marco Legal (Art. 17).

Com o estabelecimento da regionalização (embora o modelo desponte como instrumento fortalecedor das competências municipais, haja vista a racionalização dos custos (BRAZ, 2021)), é fato, é notório que o contexto diminui a relevância dos PMSBs. Segundo o Art. 17, “as disposições constantes do plano regional de saneamento básico prevalecerão sobre aquelas constantes dos planos municipais, quando existirem” (BRASIL, 2020b).

Nesse sentido, ressalta-se que os Planos Regionais, em geral, possuem uma abordagem menos detalhada em comparação aos Municipais, perdendo em representatividade para ganhar generalidade. Em Alagoas, especificamente, os planos mencionados são insuficientes, pois não incorporam todos os territórios dos municípios (limitando-se às áreas urbanas e aos povoados com mais de 1.000 habitantes), tratam apenas dos eixos de água e esgoto e não incluem todos os municípios do estado.

Diante deste cenário, é importante destacar que a elaboração dos PMSBs vai além da prestação dos quatro componentes do saneamento básico, englobando também o planejamento, a regulação, a fiscalização e o controle social.

O presente estudo tem como objetivo discutir, por meio de um estudo de caso no estado de Alagoas, o impacto da adesão à regionalização na elaboração de Planos Municipais de Saneamento Básico. Para isso, compararam-se as experiências em cinco municípios alagoanos, dos quais três integram o Bloco B – Agreste e Sertão, enquanto outros dois optaram por não aderir à prestação regionalizada dos serviços, mantendo a competência municipal.

Salienta-se a unicidade deste estudo, pois não foi encontrado trabalho semelhante na literatura especializada, possivelmente devido ao fato de a prestação regionalizada ser um fenômeno recente, com apenas oito estados instituindo as instâncias de governança regionais (POLLINI, CLAUZET e BARBOSA, 2023).

2. MATERIAL E MÉTODOS

O presente trabalho seguiu uma adaptação do modelo de procedimento metodológico do estudo de caso (MARTINS, 2008), no qual, a partir de dados qualitativos coletados em uma situação real, os pesquisadores se debruçam sobre um único objeto, visando explicá-lo, explorá-lo e/ou descrevê-lo (YIN, 2009). Embora o estudo de caso seja alvo de algumas críticas, haja vista a dificuldade para estabelecer generalizações mediante a análise de um ou poucos casos (THOMAS, 2010), a metodologia é apreciada em diversas áreas do conhecimento, sobretudo administrativas, devido à incorporação de dados reais em pesquisas de cunho exploratório (YIN, 2009) — isto é, que buscam compreender fenômenos ainda pouco estudados (GIL, 1994).

Para compreender como a regionalização influenciou a elaboração dos PMSBs de Junqueiro, Igaci e Palmeira dos Índios, que aderiram ao Bloco B – Agreste e Sertão, e de Teotônio Vilela e Limoeiro de Anadia, que não o fizeram, seguiram-se as etapas da Figura 2.

Para tanto, desenvolveram-se seis indicadores de acom- panhamento do processo de elaboração:

 

2.1 Tempo de resposta do questionário de diagnóstico (d)

Previamente à elaboração do diagnóstico, enviou-se um formulário para as Prefeituras e para as Companhias de Saneamento de cada município. A fim de representar de maneira fidedigna a situação do saneamento, bem como auxiliar no planejamento das visitas, o preenchimento do questionário por esses órgãos é de extrema importância. Além disso, as informações são fundamentais para a pro- posição de ações, a posteriori.

Isto posto, tem-se que, quanto mais célere o preenchi- mento do formulário, mais rapidamente a equipe responsável pelo projeto pôde destinar esforços para as ações prioritárias de saneamento para o município. Além disso, pode ser visto como um meio de avaliar o comprometimento do município com a elaboração do PMSB. Desta forma, a medição desse indicador se deu pela contagem de dias para obtenção da resposta a partir da emissão do ofício.

2.2 Participação de prestadores de serviço no Grupo de Trabalho (%)

O Grupo de Trabalho deve ser formado por componentes das diversas esferas municipais, garantindo-se a representatividade dos órgãos municipais afins à área de saneamento; dos demais prestadores de serviços; da sociedade civil; e do poder legislativo municipal.

Nesse sentido, a participação direta de prestadores de serviço de saneamento é indispensável, pois o contato reforça as relações entre eles, o governo municipal, e a população local, a ser beneficiada pelas ações. Além disso, a participação popular possibilita aos munícipes levar as problemáticas vivenciadas em seu dia a dia para os prestadores de serviço, proporcionando um ambiente de troca favorável à aplicação de melhorias futuras.

Tal representatividade se mostra indispensável para a elaboração de um PMSB fiel à realidade do município. Desse modo, esse indicador foi calculado considerando a razão entre a quantidade de membros das empresas prestadoras de serviços no grupo de trabalho e a quantidade total de membros no grupo de trabalho, que foi formado junto ao início da elaboração dos PMSBs.

2.3 Adesão do Grupo de Trabalho às reuniões (%)

Ao longo da elaboração dos PMSBs, foram necessárias reuniões com os Grupos de Trabalho de cada município, nas quais a presença dos membros foi de grande No entanto, algumas reuniões tiveram participação limitada, o que contribuiu para tomadas de decisões pouco representativas nos âmbitos dos produtos e dos eventos desenvolvidos.

Desse modo, o cálculo desse indicador envolveu o valor da média da razão entre o número de participantes do Grupo de Trabalho presentes por reunião e a quantidade total de membros do Grupo. A verificação dos quantitativos se deu por meio da contagem dos presentes, registrados nas atas desses encontros.

2.4 Adesão da população aos encontros de controle social (%)

No desenvolver dos PMSBs, realizaram-se Oficinas e Conferências, que prezavam pela participação popular, de modo a recolher informações e problemáticas vivenciadas pelas diferentes regiões dos municípios alvo, bem como fomentar a contribuição social nas ações propostas nos Planos. Assim, quanto mais participação popular nesses eventos, mais realidades diferentes foram conhecidas pela equipe técnica, que, partindo disso, direcionou ações de saneamento prioritárias para as regiões que mais necessitam destes serviços.

A partir da contagem de participantes, registrada na lista de frequência desses eventos, foi possível calcular este indicador por meio da razão entre a quantidade de pessoas da sociedade civil presentes nos eventos e a quantidade total de pessoas presentes.

2.5 Desinformação populacional acerca dos prestadores (%)

Durante os eventos de participação popular, uma realidade observada pela equipe técnica responsável pela elaboração dos PMSBs foi a desinformação da população acerca de quem seriam os prestadores de serviços de saneamento na região em que moravam; deste modo, houve a necessidade constante de se explicar quem são os responsáveis. Assim, efetuou-se uma contagem dos números de eventos nos quais isto ocorreu, e a razão da contagem com o número total de eventos resultou neste indicador.

2.6 Retorno às versões preliminares dos Produtos (un)

Conforme previsto em contrato, cada PMSB elaborado contém seis produtos, entregues ao longo de um período de aproximadamente um ano. Cada um deles, em sua ver- são preliminar, teve um período específico para que os Grupos de Trabalho pudessem ler, tomar conhecimento do que foi abordado e retornar contribuições por e-mail, WhatsApp ou mesmo durante os encontros do Grupo.

Tais retornos funcionavam como um indicador de que o Grupo de Trabalho estava a par do desenvolvimento dos PMSBs. Desse modo, a quantidade de respostas ao e-mail de envio das versões preliminares de cada produto foi quantificada, configurando o presente indicador.

O Quadro 2 exibe o resumo dos indicadores considerados, bem como seus objetivos e metodologia de cálculo. Destaca-se que o cálculo dos indicadores e a análise de dados foram realizados usando estatística descritiva básica, com o cálculo de porcentagens inerentes ao conjunto de dados obtidos, a fim de comparados e assim atingir o objetivo do estudo.

3. RESULTADOS E DISCUSSÃO

A situação geral dos indicadores para os cinco municípios avaliados, dividindo-os entre aqueles com e sem regionalização, está congregada no Quadro 3. Tais resultados baseiam-se em informações coletadas pela equipe técnica ao longo de toda a elaboração dos PMSBs, que durou doze meses.

No que se refere ao Indicador 1, observou-se que os municípios do Bloco B – Agreste e Sertão demoraram 160 dias (cerca de 5 meses) para responder ao questionário de diagnóstico, resultando em respostas após o fechamento do Produto referente a esta etapa. Dentre os municípios que não aderiram à regionalização, um respondeu em 17 dias, enquanto o outro não ofereceu resposta, impossibilitando o cálculo do indicador agregado. O primeiro, Teotônio Vilela, destaca-se por ter um serviço de abastecimento de água e tratamento de esgoto próprio bastante estruturado, com maior controle das informações em relação ao segundo (Limoeiro de Anadia), cujo órgão responsável é a Prefeitura, com pouco domínio acerca dos aspectos do saneamento municipal.

Em relação à participação dos prestadores de serviço no GT, notou-se uma superioridade numérica dos municípios sem regionalização. Vale ressaltar que Junqueiro, um dos municípios do Bloco B – Agreste e Sertão, não indicou representante do prestador para o GT. Nesse contexto, percebe-se que a prestação de serviços de saneamento que engloba um bloco de municípios tem um ponto de vista mais generalizado, não considerando, em suma, a individualidade da realidade de cada local dentro de um mesmo município. Em contraste, quando a prestação de serviços de saneamento é municipal, há um maior senso de “pertencimento”, com uma preocupação maior com os aspectos específicos.

A análise conjunta dos indicadores 1 e 2, ou seja, o alto tempo de resposta e a ausência de indicação em um dos GT, pode sugerir uma subestimação do PMSB nos municípios com regionalização, possivelmente devido à pré-existência de um Plano Regional de Água e Esgoto, que se sobrepõe ao Plano Municipal. Entretanto, é importante considerar duas ressalvas. Primeiramente, a nível municipal, o Plano Regional de Água e Esgoto é menos abrangente que o PMSB elaborado, uma vez que sugere ações apenas para áreas urbanas e povoados com população superior a 1.000 habitantes, enquanto o PMSB abrange todas as localidades mapeadas, independentemente do quantitativo populacional. Em segundo lugar, o Plano Regional de Água e Esgoto abrange apenas os dois eixos concedidos para a prestação regionalizada, enquanto o PMSB engloba o saneamento como um todo. Neste contexto, ressalta-se que a existência do Plano Regional de Água e Esgoto interferiu na necessidade de seguir as diretrizes expostas neste documento, como projeção populacional e metas a serem alcançadas no horizonte de projeto. Em contrapartida, as informações levantadas no diagnóstico da situação do saneamento básico do Plano Regional de Água e Esgoto contribuíram para o entendimento do cenário municipal. Quanto à adesão aos eventos (indicador 3), novamente observa-se um maior engajamento no GT por parte dos municípios sem regionalização, seguindo a tendência anteriormente exposta — a relevância dos PMSBs em regiões sem planos regionais é superior. Nessas localidades, reforça-se que o PMSB será o estudo mais importante, com diagnóstico e proposição de ações em nível municipal. A participação popular, por sua vez, foi semelhante em ambos os agrupamentos, conforme os valores próximos obtidos no indicador 4.

Isso evidencia que, independentemente da regionalização dos serviços públicos, as comunidades estão cientes de suas realidades e direitos ao acesso aos serviços de saneamento básico assegurados pela legislação, além de estarem dispostas a buscar melhorias por meio de políticas públicas e melhorias nos diversos eixos do saneamento em suas localidades. A expressiva participação popular nestes eventos também foi fundamentada pelo processo prévio de mobilização social, utilizando estratégias como afixação de cartazes, entrega de folders, reuniões com atores sociais parceiros, faixas em pontos distintos dos municípios, anúncios via carro-de-som e envio de convites virtuais aos grupos de WhatsApp. Essa participação foi de extrema importância em todo o processo construtivo dos PMSBs, tornando os Produtos mais representativos e realísticos, sendo possível identificar problemas nas diversas zonas dos municípios e propor ações e melhorias direcionadas para cada região. Apesar da boa adesão da população nos encontros de controle social, o indicador 5 demonstra que em 100% dos eventos em municípios pertencentes ao Bloco B – Agreste e Sertão, a equipe elaboradora do PMSB precisou explicar como funciona a regionalização e quem é o prestador do serviço, indicando a necessidade de melhor comunicação e o desconhecimento da população acerca do Plano Regional de Água e Esgoto. Dado que a divisão estadual em blocos de saneamento aconteceu há poucos anos, o resultado indica que os processos de criação da estrutura regionalizada, bem como das instâncias de governança, não foram participativos e transparentes o suficiente. De acordo com pesquisa realizada em agosto de 2022 pelo Instituto de Água e Saneamento, o estado de Alagoas não apresenta informações públicas sobre as reuniões regionais de saneamento, outro fator que contribui para a desinformação populacional.

Por fim, destaca-se que nenhum dos Grupos de Trabalho fez apontamentos diretos nas versões preliminares dos Produtos, o que pode ser justificado pela falta de conhecimento técnico por parte dos membros (principalmente os da sociedade civil) e pela dificuldade na leitura de documentos extensos, possivelmente devido à falta de tempo devido ao trabalho. Assim, considerando que essas dificuldades foram comuns em todos os municípios avaliados, conclui-se que a regionalização não interferiu no processo de revisão.

Mais uma vez, enfatiza-se que não foram encontradas análises semelhantes referentes a outros estados e/ou aos demais blocos de regionalização do estado de Alagoas, o que impossibilitou a comparação dos resultados aqui postos com outros estudos de caso.

4. CONCLUSÃO

Ao longo da elaboração concomitante dos PMSBs de cinco municípios alagoanos, foi possível realizar uma análise qualitativa para avaliar se a regionalização da prestação dos serviços de saneamento influencia nesse processo. Com base nos indicadores propostos neste estudo, ficou evidente que, de maneira geral, tanto a participação dos prestadores de serviços nos GT quanto a adesão do GT como um todo às reuniões com a equipe técnica foram mais efetivas nos Municípios que não aderiram à regionalização. Atribui-se este fenômeno à existência do Plano Regional de Água e Esgoto, que, conforme a atualização do Marco Legal (BRASIL, 2020b), se sobrepõe aos PMSBs, desencorajando o investimento de tempo e esforço na construção do instrumento municipal.

Por outro lado, a participação popular equiparou-se em ambos os grupos de municípios. Esta disparidade, em comparação com os técnicos e gestores, foi atribuída à desinformação da população quanto à regionalização (e, por conseguinte, à existência do Plano Regional). Em todos os eventos dos municípios do Bloco B – Agreste e Sertão, a equipe técnica elaboradora dos PMSBs precisou informar a população acerca da mudança na prestação do serviço, surpreendendo-os, sobretudo no que diz respeito à cobrança.

Portanto, como estratégias de enfrentamento aos desafios oriundos da prestação regionalizada, o estudo evidenciou ser fundamental definir e implementar mecanismos de controle social, como forma de incluir a sociedade no planejamento e na fiscalização dos serviços de saneamento. Além disso, é crucial a melhoria das estratégias de comunicação dos prestadores regionalizados voltadas ao público em geral. Para os municípios que terão que lidar com a existência de dois planos (um municipal e um regional), a participação efetiva na instância de governança da unidade regional é fundamental para o alinhamento dos documentos e para que as necessidades locais sejam discutidas e amparadas também no âmbito regional.

 

 

Referências Bibliográficas

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YIN, R.K. Case study research, design, and methods (applied social research methods). Thousand Oaks. California: Sage Publications, 2009.

 

1Engenheira Ambiental e Sanitarista pela Universidade Federal de Alagoas. Mestre em Recursos Hídricos e Saneamento pela Ufal. Analista Ambiental na HIDROBR Consultoria Ltda. – Belo Horizonte (MG), Brasil.

2Engenheira Ambiental e Sanitarista pela Universidade Federal de Alagoas. Mestre em Saneamento, Meio Ambiente e Recursos Hídricos pela Universidade Federal de Minas Gerais. Analista Ambiental na HIDROBR Consultoria Ltda. – Belo Horizonte (MG), Brasil.

3Engenheiro Ambiental e Sanitarista pela Universidade Federal de Alagoas. Analista Ambiental na HIDROBR Consultoria Ltda. – Belo Horizonte (MG), Brasil.

4Engenheira Ambiental pela Universidade Federal de Minas Gerais. Analista Ambiental na HIDROBR Consultoria Ltda. – Belo Horizonte (MG), Brasil.

5Bióloga pela Universidade Federal de Minas Gerais. Mestre em Saneamento, Meio Ambiente e Recursos Hídricos pela Universidade Federal de Minas Gerais. Especialista em Engenharia Ambiental pela Universidade Cândido Mendes. Especialista em Gestão de Resíduos Sólidos pelo Centro Universitário Leonardo da Vinci. Coordenadora de Projetos na HIDROBR Consultoria Ltda. – Belo Horizonte (MG), Brasil.